Sobre ser mulher...

Entra ano, sai ano e eu sempre busco trazer um pouco de luz sobre a importância da existência da mulher e como carecemos de respeito em todos os espaços os quais permeamos e, ainda assim, os índices de violência contra mulher têm aumentado de forma significativa, expressiva e alarmante.

Eu busco sempre trazer temas mais leves ou tratar de forma leve temáticas que tiram a nossa paz, mas tem sido extremamente desgastante emocionalmente - pelo menos para mim - passar pelas notícias, ouvir relatos, presenciar cenas e perceber que a sociedade, apesar dos anos, ainda está há um longo caminho para ser percorrido para que seja entendido que a mulher não é objeto para ser propriedade de ninguém.

Hoje eu não quero falar sobre dados e estatísticas, não quero trazer os nomes das vítimas muito menos em como suas vidas foram ceifadas ou como elas foram violentadas.

Eu quero falar sobre o medo de muitas coisas que, talvez, me impeçam de continuar respirando, apenas por eu ser mulher.

Hoje eu quero falar sobre o sentimento de impotência em ser mulher e não poder ser mulher por medo. Por medo de vestir uma roupa e ser interpretada de maneira equivocada, de usar uma maquiagem e ser entendido que "eu provoquei". Ter medo de sair sozinha e não conseguir voltar porque neguei uma companhia ou porque o motorista do aplicativo que me conduzia entendeu que seria melhor me levar para outro lugar contra a minha vontade.

Eu quero falar sobre o medo de ir trabalhar e no meio do caminho ser interpelada por uma motivação boba, uma resposta considerada "mal-criada". Ter medo de questionar o meu direito e entenderem que eu estava querendo ser um pouco mais do que eu mereço - na visão deles, claro. 

Eu quero falar sobre o medo de não ser dona de casa o suficiente, não cuidar bem dos meus filhos ou receber olhares dos quais eu não solicitei na rua, afinal, isso pode ser um índice de infidelidade.

Eu quero falar sobre o medo de falar sobre meus desejos, meu corpo e minhas vontades.

Eu quero falar sobre receber um bom salário, ocupar espaços e cargos de liderança e, de repente, ser posta pra fora ou ser impedida de continuar vivendo, porque alguém não aceitou bem a ideia de me ter ali, naquele lugar.

Eu quero falar sobre o medo de olhar para os lados e alguém interpretar que "estou de frete" ou "procurando macho".

Eu quero falar sobre o medo de fazer tudo o que o script social do que é ser mulher corretamente e, ainda assim, ter minha vida levada por alguém que se julgou melhor, maior e mais forte do que eu.

Eu quero falar sobre todas essas coisas que me atravessam por ser mulher e que me assustam ser mulher.

E, para encerrar, eu trago um questionamento que já trouxe em outro momento, em um texto de 2021 para o Dia Internacional da Mulher:

"O que você já deixou de fazer por ser mulher?"

E acrescento:

"O que te faz ter medo de ser mulher?"